O Papa Francisco encerrou sua viagem apostólica à Hungria depois de realizar um encontro com o mundo acadêmico e universitário na Universidade Católica Péter Pázmány, além de ter participado da cerimônia de despedida no aeroporto internacional de Budapeste.
Na universidade católica, o Santo Padre referiu-se ao conhecimento, aos avanços técnicos, à sensação de ser e ter, ao risco de o homem se deixar esmagar pelas máquinas, perder o contato com a realidade e a capacidade de cultivar o espírito. Fez também referência ao perigo “daquelas ideologias que carregam uma falsa ideia de liberdade e ao que viveu a Hungria, que assistiu à sucessão de ideologias que se impuseram como verdades, mas que não deram liberdade”.
“Ainda hoje” -afirmou- “o risco não desapareceu: penso na passagem do comunismo ao consumismo. Em comum, ambos os ‘ismos’ contêm uma falsa ideia de liberdade; a do comunismo era uma ‘liberdade’ forçada, limitada de fora, decidida por outro; a do consumismo é uma ‘liberdade’ libertária, hedonista, achatada em si mesma, que escraviza o consumo e as coisas”.
Francisco afirmou que “é fácil passar dos limites impostos ao pensamento, como no comunismo, para um pensamento sem limites, como no consumismo, e de uma liberdade que se restringe a uma liberdade sem freios”. “Jesus ensina que é a verdade que liberta o homem das suas dependências e dos seus fechamentos”, sublinhou o Papa, acrescentando que “a chave para aceder a esta verdade é um conhecimento que nunca se desvincula do amor, relacional, humilde e aberto, concreto e comunitário, corajoso e construtivo”.
O Papa também disse que a cultura é como “um grande rio” que “permite navegar pelo mundo e abraçar países e terras distantes, satisfaz a mente, rega a alma e faz crescer a sociedade”. “A própria palavra cultura deriva do verbo cultivar. O conhecimento implica uma semeadura diária que, penetrando nos sulcos da realidade, dá frutos”, disse o Bispo de Roma.
A seguir, o pontífice citou Romano Guardini, que se referiu a duas formas de conhecer: uma delas é aquela que “nos leva a mergulhar nas coisas e no seu contexto”, e outra que “consiste em apreender, decompor, classificar, tomar posse do objeto, domine-o. Este último, disse ele, em que “energia e matéria foram conduzidas para um único fim: as máquinas”.
Nesta linha, o Papa esclareceu que Guardini “não demoniza a tecnologia, que nos permite viver melhor, comunicar e ter muitas vantagens, mas alerta para o risco de que ela se torne reguladora, senão dominadora, da vida”, e convidou a pensar, entre outras coisas, “da crise ecológica, da natureza que simplesmente reage ao uso instrumental que lhe demos”.
Assegurou ainda que esse risco se reflete “na solidão de indivíduos muito ‘redes sociais’ mas ‘anti-sociais'”, que recorrem à técnica “para preencher o vazio que experimentam, correndo de forma ainda mais frenética enquanto, escravos do capitalismo selvagem, sentem ainda mais dolorosamente suas próprias fragilidades, numa sociedade onde a velocidade externa anda de mãos dadas com a fragilidade interna”.
Diante deste panorama, o Papa chamou a refletir sobre a “arrogância de ser e ter”, onde o “paradigma tecnocrático exaspera, com certo uso de algoritmos que podem representar um risco ulterior de desestabilizar o humano”. De fato, citando Benson, o Papa alertou contra “ideologias opostas” que convergem “numa homologação que coloniza ideologicamente”.
“O homem, em contato com as máquinas, achata-se cada vez mais, enquanto a vida comum se torna triste e rarefeita”, continuou o pontífice, que perante tal panorama, pediu que a universidade seja um lugar onde o pensamento “nasce, cresce e amadurece aberto e sinfônico, o ‘templo’ onde o conhecimento é chamado a se libertar dos limites estreitos do ter e do possuir para se tornar cultura, ou seja, o ‘cultivo’ do homem e suas relações fundamentais: com o transcendente, com a sociedade, com a história , com a criação”.
O Papa recordou o que foi afirmado pelo Concílio Vaticano II, no qual “a cultura deve estar subordinada ao aperfeiçoamento integral da pessoa humana, ao bem da comunidade e de toda a sociedade humana”. Portanto, é preciso cultivar o espírito de modo que se promova a capacidade de admiração, intuição, contemplação e julgamento pessoal, bem como o poder de cultivar o senso religioso, moral e social’.
Francisco disse que a cultura “nos acompanha no conhecimento de nós mesmos”, o que significa “saber reconhecer os próprios limites e, consequentemente, refrear a presunção de autossuficiência”, afirmando que isso “faz bem, porque se trata de todos nos reconhecermos como criaturas quando nos tornamos criativos, mergulhando no mundo, em vez de dominá-lo”.
Por fim, desejou que esta universidade, junto com todas as outras, fossem centros de universalidade e liberdade, “uma fecunda obra de humanismo, uma oficina de esperança”.
Fonte: https://www.infocatolica.com/?t=noticia&cod=46321